Varejo da construção reestrutura plano de marketing na pandemia
26 de janeiro de 2021 às 13:42
Diante da explosão das vendas, marcas investiram mais em serviços e no e-commerce, além de tutoriais para ensinar o público a fazer reparos
Por Janaina Langsdorff
O pedido “Fique em casa” ecoou como um apelo repetido em todo o mundo, transformando-se no slogan da campanha contra a Covid-19. Quem conseguiu obedecer, fez do lar o seu refúgio, mas acabou descobrindo a necessidade de pequenos reparos e obras dignas de muito barulho invadindo lives e reuniões em pleno home office. Classificado como comércio essencial, o varejo da construção foi obrigado a rever a sua estratégia de marketing para se adequar ao aumento das vendas.
A casa ganhou um novo significado e as marcas são unânimes nessa conclusão. “A demanda por todas as categorias cresceu a taxas de 100%”, conta Pablo Satyro, diretor de marketing e e-commerce da Telhanorte, rede com 50 lojas pertencentes ao grupo francês Saint-Gobain, que ainda controla a bandeira Tumelero, dona de 29 unidades no Rio Grande do Sul. Surpreendida, toda a cadeia do setor sofreu com a escassez de produtos. “Não podíamos chamar as pessoas para as lojas, o que tornou o trabalho de comunicação mais desafiador”, lembra Satyro.
Ao estudar as necessidades das pessoas, a marca decidiu redirecionar os seus esforços para a oferta de produtos e serviços. Um deles foi o “Telhanorte Já! Na sua porta”, uma van que estacionou em diversos condomínios da capital paulista levando cerca de 800 produtos emergenciais como canos e ferramentas. “Foi uma forma de atender as pessoas, manter vendas e fazer comunicação”, frisa Satyro.
Em outra frente de trabalho, os influenciadores Rafa Brites, Isadora Ribeiro, Juizão e o casal Lucas Silveira e Karen Joz produziram tutoriais sobre o universo da casa dando uma mão para aqueles que se aventuraram no “faça você mesmo”. Esse público ainda contou com o “Ajuda ao vivo”, um serviço de assistência técnica gratuita com atendimento feito pelo WhatsApp. Da empatia para ouvir, veio a estratégia criada pela Tech and Soul, que ganhou a conta da Telhanorte em maio de 2020, mesmo mês em que lançou o conceito Viva a sua Casa.
“Convidamos as pessoas a transformarem reclusão em algo positivo, com mais momentos em família”, explica Claudio Kalim, CEO da agência, que produz cerca de 400 peças por mês, entre mídia digital, redes sociais, materiais impressos e filmes. No Dia dos Pais, a marca usou cenas de pais e filhos realizando reparos juntos para apertar os laços de família.
Logo veio o período que antecede o Natal, quando as vendas aumentam em função do desejo das pessoas de ajeitarem as suas casas para as festas de fim de ano. Mas como não foi possível receber amigos e familiares, a marca realizou uma ação para transmitir otimismo. Levou consumidores para uma casa com rigorosos controles de assepsia montada em frente à loja da Marginal Tietê.
Com proteções de plástico, os participantes puderam se abraçar com segurança. No total, foram oito histórias gravadas nos dias 12 e 13 de dezembro de 2020. Entre elas, a de uma garota que encontrou o avô após nove meses de distanciamento. “Realizamos um trabalho de varejo com posicionamento de marca”, define Kalim.
Mão na roda
O ambiente digital não deixou o varejo da construção desmoronar. Na Telhanorte, o e-commerce cresceu 200%. Já a C&C superou a entrega da Black Friday de 2019 apenas no primeiro mês da pandemia, decretada em março do ano passado. “Batemos recordes até chegar a Black Friday 2020, que novamente ultrapassou as vendas”, revela Marcelo Roffe, diretor-geral da C&C. “O ambiente online representa cerca de 40% do investimento da C&C em marketing”, conta Roffe.
As vendas pelo WhatsApp e a retirada de produtos foram reforçados, mas o executivo reconhece o susto. Com as lojas fechadas por 10 dias, as vendas em abril chegaram a cair pela metade, mas se recuperaram paulatinamente. “No segundo semestre, ao contrário, acabamos tendo problemas de abastecimento. A indústria não estava preparada para absorver a demanda”, analisa o executivo.
Construída pela Publicis Brasil desde 2017, a comunicação da C&C trabalha hoje o conceito Ocupe o seu espaço, criado no fim de 2019 com base em dados que apontaram a C&C como uma marca omnichannel, com produtos de qualidade, bom atendimento e preço.
“Queremos encorajar as pessoas a personalizar o seu ambiente”, comenta Gabriela Borges, head de atendimento da agência. Com cenas de pessoas trabalhando em casa, o filme foi lançado em fevereiro de 2020. Um mês depois veio a pandemia. “Mais atual, impossível”, observa Roffe.
A volta gradativa reintegrou os meios tradicionais “usando dados para entender a dinâmica dos consumidores”, frisa Gabriela, citando como exemplo a campanha de fim de ano com o mote É tempo de pensar em quem mais esteve com você este ano: sua casa.
Um novo filme desdobrará em breve a linha de comunicação Ocupe o seu espaço, que segue valendo para o cenário vigente, mesmo com a aprovação das vacinas Coronavac e Astrazeneca. “Os nossos colaboradores estão na faixa de 30 anos, fora das fases de vacinação”, lamenta Roffe. Os 2,3 mil colaboradores da rede recebem cerca de 1,5 milhão de clientes nas 36 lojas situadas em São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. “O home office impulsionou novas necessidades de habitação e vai se manter em 2021”, aponta Gabriela.
A mineira MRV vai além. “Varandas, áreas privativas, espaços de lazer e coworking ganharam importância”, enumera Rodrigo Resende, diretor de marketing e novos negócios da construtora. A transformação do lar em hub de trabalho, estudo e entretenimento puxou ainda a procura por casas de aluguel e de temporadas.
“As nossas vendas líquidas cresceram 41,1% de março a setembro, período da pandemia, desencadeando novos produtos, além de fortalecer o meio digital”, destaca Resende. Segundo o executivo, o mercado imobiliário reagiu positivamente. Presente em mais de 160 cidades brasileiras, a MRV constrói empreendimentos residenciais populares desde 1979.
Propósito
Os franceses da Leroy Merlin também consolidam as suas bases no Brasil, onde está desde 1998. Hoje com mais de 80 mil itens de 15 categorias, a marca enviou uma mensagem de esperança aos brasileiros em abril de 2020 com o filme Vai passar. Investiu também em colab, além de usar influenciadores para promover a bricolagem. As ações foram criadas pela FCB Brasil, que em dezembro rompeu o contrato com a marca. A nova agência ainda não foi revelada.
Mas para Waldir Abreu, superintendente da Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção (Anamaco), os líderes do setor devem se unir em prol de movimentos capazes de fomentar a reforma de casas mal construídas, valorizando o propósito de marca. “A pandemia sacudiu o mercado, que agora precisa ter mais responsabilidade social e interagir com as autoridades municipais para que os brasileiros possam ter habitações mais dignas”, adverte Abreu.
Comunicação, logística e relação com a indústria também desafiam o setor, que está longe da consolidação. Segundo a Anamaco, a liderança é da Leroy Merlin, seguida pelo Grupo Saint Gobain, Sodimac, C&C e pela rede Ferreira Costa, de Pernambuco. Ainda existem redes como Center Castilho, Grupo Village e Joli, em São Paulo, além de cadeias de bairro e operações familiares regionais que fazem do Brasil um mercado com oportunidades promissoras.
De Minas Gerais, vem o exemplo da rede familiar ABC da Construção, com 60 anos de história. Pequenas lojas se tornaram parceiras de distribuição da empresa, que transformou o negócio em uma plataforma colaborativa e omnichannel. “Sobreviverá quem souber combinar loja física, digital, centro de distribuição e logística eficaz”, pontua o economista da Anamaco. A entidade estima que o varejo da construção tenha faturado R$ 166 bilhões em 2020, alta de 11% ante o ano anterior.
Confira o filme da Telhanorte com o conceito Viva a sua Casa:
Abaixo, o filme da C&C com o mote Ocupe o seu espaço: